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Décio Galina

Desmaio na rua, racho a cabeça e me desespero ao pensar nos filhos

Décio Galina

01/12/2017 08h00

Eu e Vanina, de chapéu, durante Torta na Cara, uma das atividades que rolava na Trip Editora em 2015

Nesta semana desmaiei na rua, por volta das 4h da tarde, pela primeira vez na vida. Na queda, bati a cabeça no pneu de um carro estacionado e abri um pequeno rasgo, coisa de dois pontos, nada grave. Se continuasse andando e desmaiasse no meio da Teodoro Sampaio, aí sim, estaria frito. Mas a sensação de apagar e abrir os olhos depois de um tempo indeterminado e ver as pessoas horizontal, com o chão em primeiro plano, é péssima. Levantaram-me pelo braço. Pelo tom assustado das vozes, o tombo foi feio, e a pancada, forte. "Tá sangrando, tá sangrando", repetiam com olhos arregalados. Fiquei em pé. Achei que estava melhor. Puf.. Apaguei de novo. E lá estava eu abrindo os olhos no chão, com a visão bem turva, bastante zonzo. Depois, contaram-me que desmaiei pela terceira vez, mas disso mal tenho registro. O que recordo é de uma moça chamada Aline segurando gelo na minha cabeça até estancar o sangramento. Minha visão começou a melhorar e, da tontura, passei a sentir apenas dor física na cabeça, no pescoço e nos ombros.

Assim que retomei a consciência, meu primeiro desespero veio embalado pela imagem dos meus dois moleques. Será que tinha acontecido alguma coisa comigo que poderia me privar da festa que é a vida ao lado deles? Essa angústia deu um nó imediato na garganta. Pedi para a Aline ficar bem esperta comigo, pois ia tentar me levantar da cadeira e mover os braços e as pernas para saber se estava, minimamente, tudo dentro dos conformes. Aline não achou boa ideia, disse que eu não estava bem, mas seguiu ao meu lado ao perceber que não tinha muita escolha. Levantei. Movi todos os membros, com dor, mas feliz da vida ao sacar que, pelo jeito, nada de grave tinha acontecido. Fiquei emocionado ao sentir que não haveria grandes abalos na convivência com os filhos. Impressionante isso na paternidade. Instintivamente, não me preocupei com o "meu" futuro, mas, sim, se haveria alguma questão que cerceasse minha relação com os meninos.

Eu e o jornalista Messias, fazendo propaganda das camisetas da Quatro Linhas, feitas pela designer Vanina

Como a ambulância não chegava nunca, escrevi para a Carol, minha mulher, que estava longe de Pinheiros. Então, ela acionou o Pedro, camarada que trabalha na editora Trip, onde estive por 16 anos e resolvi sair em julho último. A editora fica a dois quarteirões de onde caí. Pedro chegou rapidamente, pegamos um táxi e voamos para o hospital São Camilo. Passei a tarde fazendo exames e lá pelas 11h da noite estava em casa, com o alívio dos resultados que comprovaram que estava tudo bem, nada quebrado, mas com a dúvida incômoda do motivo que desabei, a poucas semanas de completar 45 anos. No almoço antes do meu desmaio, não fiz nada fora da rotina. Para matar a saudade de grandes amigos dos tempos da editora Trip, dividi uma mesa da Cantina Giggio com Messias (jornalista craque em música e autor de diversas capas que editamos juntos em Audi Magazine), e Vanina, designer de mão cheia com quem fiz edições maravilhosas de Revista Personnalité e que hoje se desdobra nas vendas das belas camisetas que cria para a marca própria Quatro Linhas. Na mesa ao lado, a redação da Revista Gol, publicação que tenho um carinho especial.

O designer, e querido amigo, Alex, com sua Harley Davidson 1973, customizada pelo Cycle Zombies

Brindamos a vida com uma jarra de suco de tangerina bem doce e um copão de caipirinha para três pessoas, cortesia especial do Toninho, que contou algumas passagens de sua mais recente viagem para a Itália, quando teve a chance de sentir como galopam os cavalos de uma Ferrari. Saí bem do almoço, fui ao banco com os amigos, entre eles, o designer Alex, outro baita profissional, gente fina ao extremo, que literalmente parou a rua dos Pinheiros com sua Harley customizada. Me despedi da turma e, antes de pegar o 856-R Socorro-Lapa para a casa, resolvi parar no bar da esquina da Teodoro com a Francisco Leitão para tomar um suco de melancia. Fazia um calor monumental.

Sentei em uma mesa do lado de fora, deixei as pernas na linha do sol. Tomei o suco e a visão começou a embaçar. Sensação horrível. Não sabia bem o que fazer. Não me sentia enjoado, só tonto. Levantei para pagar o suco, mal dei três passos e desabei. Daí pra frente você já sabe o que aconteceu. Meu coração acelera só de lembrar. Para acalmá-lo, respiro fundo e dou uma olhada na foto do Nico e do Felipe. Tudo certo, meus amores. Esse cabelo raspado na tampa da minha cabeça e a pequena costura na pele logo farão parte do passado. Saio agora para passar por outra consulta e novos exames. Prometo redobrar a atenção comigo mesmo, meus filhotes, para que possamos desfrutar numa boa dos meus próximos 45 anos, sem que as pessoas precisem me levantar do chão com a cabeça ensanguentada.

Sobre o autor

Paulistano de 1973, Décio Galina fez jornalismo na Cásper Líbero no início dos anos 1990 – os computadores chegavam à faculdade na época em que ele suava para passar nos testes do curso de datilografia do Senac. Trabalhou com Caco Barcellos na pesquisa do livro “Rota 66”. Passou alguns meses na “Gazeta Esportiva” antes de ficar cinco anos de fortes emoções na editoria Geral do jornal “Notícias Populares” – foi de repórter policial a editor. Deixou a vida do crime na periferia e começou a editar a revista “Daslu”, na Trip Editora. Ficou na Trip de 2001 a 2017: 16 anos produzindo conteúdo para marcas como Itaú Personnalité, Mitsubishi, Pão de Açúcar, Natura, Gol Linhas Aéreas, entre outros. Já viajou bastante, dentro e fora do país, o suficiente para saber que o Brasil é seu lugar predileto.

Sobre o Blog

Como curtir a vida com dois filhos moleques (2 e 10 anos), viagens dentro e fora do Brasil e os caminhos de Bilhete Único em São Paulo -- já que o autor sabe dirigir revista, mas não dirige carros...

Décio Galina